Amados irmãos e irmãs, “não temais, porque vos
anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de
Davi, um Salvador, que é Cristo Senhor” (Lc 2,10-11). A promessa de um futuro
novo de paz e de felicidade para o Povo de Deus se cumpre de modo excelente no
nascimento do Menino Deus, o Emanuel, Deus Conosco, Jesus Cristo, nosso
Salvador. É esse o grande Mistério que celebramos nesta noite: a Encarnação do
Verbo, a iluminação do mundo. “Deus iluminou esta santíssima noite com o
esplendor, o brilho de Cristo, verdadeira luz do mundo” (cf. A. Vanhoye). A
profecia de Isaías ganha corpo e vida: “o povo que andava nas trevas viu uma
grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a
brilhar” (Is 9,1). Num contexto difícil para o povo de Israel, marcado pelas
dores das distâncias de suas raízes tendo em vista o fato de estar oprimido sob
o jugo dos poderosos, numa condição de exílio, o profeta anuncia a razão de sua
esperança “nasceu para nós um menino, foi-nos dado um filho” (Is 9,5). Embora
seja esta uma profecia para um contexto próprio (político e religioso),
trata-se de uma profecia que se cumpre de modo pleno no nascimento do Messias.
A dimensão do filho que nos foi dado nos remete de uma forma muito bela à dimensão
do Natal como Dom de Deus para a humanidade. Portanto, em meio às trocas de
tantos presentes entre nós, a grande alegria do Natal é reconhecer que o maior
e mais sublime presente nos foi dado pelo Pai do Céu, o seu próprio Filho. De
fato, nesta noite santa e feliz, o poder das trevas torna-se vulnerável diante
do poder da Luz. A luz brilha nas trevas. Brilha nas trevas do sofrimento, nas
trevas do pecado e das suas consequências. A luz, que é o Cristo Jesus, veio
para instaurar um Reino de Justiça e de Paz. Daí que se torna urgente e
necessário vencermos tudo o que é exploração, injustiça, egoísmo, violência e
morte. Acolher Jesus é deixar-se vencer pela sua Bondade e pelo seu Amor,
eliminando toda maldade erradicada no coração do homem e promovendo o bem e o
direito do próximo. Trata-se, pois, de vencer toda manifestação do mal,
deixando transparecer por meio da purificação de nosso interior e através de
nossas atitudes a figura singela, mas viva e eficaz do Verbo encarnado, do Deus
menino. Contemplando o Menino Deus deitado numa manjedoura, um lugar que se
utilizava para alimentar os animais, num estábulo, entendemos que esta noite de
Natal alimenta em nós uma certeza de fé: Deus feito criança que não encontrou
antes um lugar mais adequado para o seu primeiro repouso após o parto em Belém,
busca hoje em cada ser humano um colo acolhedor para sua divindade. O lugar
propício de acolhida deste Deus criança é o coração humano que ao viver esta
grande alegria de ver um Deus que bate à sua porta como uma criança inocente,
deve deixar-se tocar por Ele e pelo seu olhar salvífico. O Bom Menino deseja
transformar o nosso interior em sua casa, em sua habitação. Disse o evangelista
João: “O Verbo fez-se homem, montou a Sua tenda entre nós e nós vimos a Sua
glória, glória que vem do Pai...” (Jo 1,14). Assim, onde ainda existe dor, a
presença do Menino Deus quer nos acalentar e consolar, além de nos revelar que
o próprio Deus é solidário conosco, assumindo-nos e assumindo o nosso jeito
limitado de viver. Ele se faz um de nós, um conosco, um entre nós, para nos
mostrar que é possível, na medida em que seguimos os seus passos, chegar com
Ele à glória dos céus. Onde ainda existe o desespero, a presença do Menino Deus
nos faz lembrar que a vida de todo ser humano tem sentido e que recomeçar a
cada dia é nascer de novo para a vida em Cristo, cultivando sempre a virtude da
esperança. Celebrando o Natal do Senhor, ninguém tem o direito de desistir de
si mesmo e da possibilidade de ser transformado no Amor. Deus que é Amor torna possível
que todo ser humano acredite no seu valor e se abra à Graça da presença e
permanência de Deus em sua vida. Como lembra o Apóstolo Paulo, em sua carta a
seu amigo Tito, como manifestou-se a graça de Deus, fonte de salvação para
todos os homens, devemos, portanto, aprender a renunciar à impiedade e aos
desejos mundanos, para vivermos, no tempo presente, com temperança, justiça e
piedade” (cf. Tt 2,11-12). Trata-se de um apelo consistente para que diante de
tão grande luz, não sejamos tolos insistindo em permanecer nas trevas. Ele nos
interpela, portanto, a nos distanciarmos de todo apego egoísta que impede a
sensibilidade diante do próximo e da própria comunidade. É preciso promover a
verdadeira Paz porque nasceu para nós o Príncipe da Paz. Ele é o Deus forte que
“para escandalizar os poderosos”, se reveste da fraqueza de um recém nascido. O
seu poder de salvação não está nas seguranças nas quais o mundo insiste em
acreditar, quais sejam, nas armas, no status ou no prazer, mas seu poder de
salvação está exatamente no despojamento de si e na humildade daquele que vem
para fazer a Vontade do Pai. “Sendo Ele, de condição divina, não considerou
como uma usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a
condição de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de
homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz (Fl
2,6-8). Aqui nos lembramos especialmente que a Páscoa começa com o Natal. Há
uma relação íntima entre o Natal e a Páscoa. Na Páscoa culmina o esvaziamento
de Jesus que começou nesta noite santa com sua encarnação. Por isso, o Menino
Jesus foi enfaixado por sua Mãe antes de ser colocado na manjedoura (Lc 2,7).
As faixas que o envolvem na manjedoura já prenunciam a toalha de linho que o
cobrirá na sua morte. Maria acompanha desde este momento a realização do
Projeto de Salvação através de seu Filho. Antes o envolve para proteger o
recém-nascido. Depois o verá envolvido sem vida, mas com o seu “SIM” vivido
plenamente. Ela o acompanha desde o seu nascimento até a sua morte. É a mãe que
trouxe ao mundo o Salvador. É a Mãe que se alegra com o seu nascimento e sofre
com sua paixão. É a Mãe que inspira a Igreja, a todos nós, a gerar Cristo no
mundo, levando-o a todo ser humano. Essa é a mais bela missão da Igreja, ser, a
exemplo de Maria, a portadora da Luz, a que dá à Luz o Cristo Salvador e torna
possível assim que o mundo inteiro seja liberto das “botas de tropa de assalto
e dos trajes manchados de sangue” (cf. Is 9,4), isto é, de toda violência e falta
de sentido para a vida. Feliz Natal para todos! «Glória a Deus nas alturas e
paz na terra aos homens por Ele amados» (Lc 2,14)"
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