Pe. José Antonio de Oliveira
Imagine um país onde, de repente, não
existisse mais morte. Ninguém mais morresse. Seria muito bom, não? Nem tanto!
Em pouco tempo, haveria uma multidão de pessoas doentes, extremamente idosas
(ou velhas, mesmo), cansadas desta vida, sem saber o que fazer. Depois de
alguns anos, muita gente começaria a atravessar a fronteira, em busca de um
país onde houvesse morte, onde as dores não fossem eternas.
Esse é o enredo do livro de José Saramago
“As Intermitências da Morte”. Um dos seus objetivos é mostrar que a morte é
necessária. E que ela também quer ser amada e valorizada. Na história que ele
narra, o desaparecimento da morte gera um caos, e sua volta traz um grande
alívio. As pessoas passam a olhar para ela com mais simpatia, e entendem que a
morte faz parte da vida.
O mês de novembro começa trazendo para nós
essa realidade. Não é agradável pensar e conviver com esse mistério. Mas é
bobagem fugir dele ou tentar ignorar. E, já que não podemos viver sem ela, o
mais sábio é aprender a conviver com ela sem sofrer mais do que o necessário.
A ciência faz a sua parte.
Tem conseguido aliviar os sofrimentos, atenuar as dores, prolongar os anos de
vida. A inteligência humana tem buscado ainda formas de, não só manter a pessoa
viva, mas também proporcionar um pouco mais de qualidade aos últimos anos aqui
na terra. A fé é uma grande parceira na busca de viver melhor essa realidade.
Além de trazer a garantia da vida eterna, nos conforta na dor e alimenta a
esperança. Dizia Blaise Pascal: “A ciência procura afastar a morte; Jesus
Cristo veio prolongar a vida”.
Para as pessoas que creem,
“a vida não é tirada, mas transformada”. Podemos dizer que, com a morte, ela é
ampliada, se torna mais plena. “Se o grão de trigo não cai na terra e não morre
será apenas um grão de trigo; mas se é enterrado e morre, renasce e dá muitos
frutos” (Jo 12,24).
Para nós, o ato de morrer
significa a morte de tudo aquilo que é limitação e fragilidade. O nosso corpo,
por mais que seja bonito e perfeito, é frágil; envelhece, se desgasta, vai se
consumindo. Além disso, tem muita coisa em nós que nos faz mal. E precisa
morrer. Em primeiro lugar, o nosso ego, o desejo de prestígio, a vaidade, a
ambição, a mania de grandeza, tudo isso que nos torna vazios e nos isola dos
outros. Depois vêm os medos que nos fazem sofrer tanto: medo de perder as
pessoas, as coisas, a posição, o emprego, a segurança, a honra, os sonhos... de
perder a vida. Tem ainda o egoísmo, fruto de um ego doentio, que mata em nós o
espírito de fraternidade, de solidariedade. Tudo isso deve morrer, para deixar
nascer uma pessoa nova, livre, leve, feliz.
Mas é claro que a
ressurreição não acontece somente após o óbito. Toda a vida é um processo de
morrer e renascer. A cada dia podemos matar um pouco de tudo isso que nos tira
a qualidade de vida. Um dia, acontecerá a ressurreição plena. E a vida eterna
na qual nós acreditamos não se limita a uma ressurreição meio mágica que acontece
pós-morte. De fato, há muitas formas de se continuar vivo. É comum ver escrito
em algumas sepulturas: “Ninguém morre, enquanto permanece vivo no coração de
alguém”. E é verdade. Há pessoas que se foram e estão mais vivas do que nunca.
Vivas junto de Deus e no coração, na lembrança, nas obras, nos filhos e netos,
nos gestos, nas sementes que espalharam. Sua história e seu nome permanecem.
Jesus Cristo é o maior
exemplo. Cremos na sua ressurreição. Mas, mesmo humanamente falando, ele
continua muito vivo e presente. Milhões e milhões de pessoas o sentem e
experimentam na sua vida. Ele transformou, transforma e continuará mudando a
vida de muitos. Suas palavras e atitudes são sempre atuais. Ele continua a
falar, agir, perdoar, amar, transformar e salvar em todos os cantos da terra.
Sepultaram seu corpo, mas ninguém jamais sepultará sua vida, seu sonho, seu
projeto do Reino de justiça e de paz. E assim acontece também conosco. A gente
vai... mas não morre.
Aí você pode dizer: tudo
bem, é muito bonito; mas a verdade é que a morte é cruel, machuca, surpreende,
dá uma rasteira quando menos se espera. É verdade. Contudo, ela é justa. Não
faz diferença. Iguala a todos. É a forma de colocar as coisas injustas no seu
lugar. E, além do mais, a dor faz parte da vida. A cirurgia, o tratamento para
se recuperar a saúde dói. A poda machuca. A saudade incomoda. A separação,
mesmo que necessária e desejada, fere o coração. O amor dói. É certo: não
existe vida sem dor. Como não existe vida sem morte... e morte sem vida.
PASCOM - Paróquia São Sebastião
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