Fotógrafo cria projeto de revitalização do Rio Doce depois de tragédia
Um brasileiro de Minas Gerais famoso no mundo todo está liderando um projeto grande de recuperação da área devastada pela enxurrada de lama.
Os olhos de Dejanira Kranak estão como o Rio Doce – já não tem água. A índia chora sem lágrimas a morte do grande rio. Os 600 índios da última aldeia do vale do Rio Doce estão de luto. Os Krenaks querem ser compensados por quem matou o rio que eles chamam de grande.
Navegando entre peixes mortos, num rio vermelho de lama, o pescador também lamenta. A perda do rio é a perda da profissão, dele e da esposa.
“A nossa região aqui é fraca de emprego, não tem nada pra gente fazer. E não é só eu. Muitas famílias estão na mesma situação que eu estou”, lamenta Arilsom Pereira.
O Rio Doce já vem doente há muito tempo. O desmatamento das suas margens, o desvio das suas águas para fazer represas ou para a agricultura, tudo isso contribuiu pra reduzir o nível do rio dramaticamente.
Em Aimorés, por exemplo, mais de 500 quilômetros rio abaixo com relação à barragem que rompeu em Mariana, se vê estruturas construídas para servir de mirantes para o rio. Delas, só se vê pedra – o antigo leito do rio doce. Mas em Aimorés mesmo, existe uma pessoa de fama mundial que ainda enxerga alguma esperança para o Rio Doce. Curiosamente, um cidadão chamado salgado. Sebastião Salgado.
Os olhos do fotógrafo revelaram as tragédias do planeta. Agora, eles se voltam para a morte do seu rio mais querido.
“Esse rio é meu rio, eu nasci aqui. Eu cresci aqui. Eu de criança nadei muito nesse rio. E hoje, ver esse rio morrer, pra mim é de uma tristeza profunda. Realmente profunda”, diz o fotógrafo e vice-presidente do Instituto Terra, Sebastião Salgado.
Sebastião Salgado saiu jovem de Aimorés. Voltou como um dos fotógrafos mais conhecidos do mundo. Encontrou a antiga fazenda do pai desfigurada pela criação de gado, sem as matas do tempo de criança. Resolveu cuidar das suas raízes replantando a terra onde nasceu.
Salgado devolveu à Fazenda Bulcão dois milhões de mudas de espécies nativas. Junto com o verde, resgatou a água de dezenas de nascentes. Brotou daí o Instituto Terra. A ONG virou dona da fazenda e se transformou numa forte produtora de mudas da mata atlântica. Um centro que espalha há 17 anos a receita que curou a antiga fazenda dos Salgado.
Jovens técnicos agrícolas, como Cíntia, são formados pelo instituto. Vão de porteira em porteira convencendo agricultores como Seu Ademir a salvar as nascentes. E isso agora pode ajudar a salvar o próprio Rio Doce.
“Todo mundo ajudando um pouquinho é claro que vai melhorar as coisas”, diz o produtor rural Ademir Corteletti.
“Todo mundo ajudando um pouquinho é claro que vai melhorar as coisas”, diz o produtor rural Ademir Corteletti.
O Instituto Terra orienta, constrói fossas para tratar o esgoto. Dá até a cerca para o agricultor afastar o gado que pisoteia e sufoca os olhos d'água. Com R$ 12 mil, consegue salvar duas nascentes, em média, por propriedade.
Jornal Nacional: E aquelas que estão secas há mais tempo, têm volta?
Jaeder Lopes Oliveira, gerente ambiental do Instituto Terra: Tem volta. A experiência que nós temos lá também, dentro do Instituto Terra, sete nascentes que não existiam e voltaram a jorrar depois de sete anos.
Jaeder Lopes Oliveira, gerente ambiental do Instituto Terra: Tem volta. A experiência que nós temos lá também, dentro do Instituto Terra, sete nascentes que não existiam e voltaram a jorrar depois de sete anos.
O Instituto Terra estima que o Rio Doce é formado de 370 mil nascentes. Trezentas mil estão ameaçadas.
Salvar as nascentes pode devolver água para o rio, lavar a lama que o sufocou – essa é aposta do grande fotógrafo.
“Olha a diferença da água. Era assim que era a cor da água, assim que ela é hoje. E aqui você vê a densidade da lama acumulada aqui”, ele mostrou.
Salgado quer que a empresa responsável pelo desastre financie a recuperação das nascentes em todo o vale do Rio Doce.
“A proposição é de se criar um fundo, um fundo imenso, que nos permita replantar todas as nascentes do Rio Doce. Reconstituindo a reserva legal e instalando um sistema de tratamento de esgoto e captação de lixo em toda a bacia. Nós podemos começar esse projeto imediatamente, e para isso nós necessitamos de um fundo considerável”, diz Salgado.
O investimento vai ter de ser proporcional ao tamanho do estrago, como já aconteceu em outras partes do mundo, diz Sebastião Salgado.
“Olha, nós já tivemos reunião com os governadores, eu tive uma reunião com a presidente Dilma, que adotou a causa. Ela está extremamente sensibilizada, como tão sensibilizados todos os brasileiros”, Salgado contou.
Aos 72 anos, Sebastião Salgado nos inspira a buscar um ângulo positivo na tragédia.
“Eu espero, antes de morrer, ver esse rio completamente restabelecido, recuperado. Dá pra fazer”, afirma Sebastião.
A Vale afirmou que tomou conhecimento da criação do fundo proposto pelo fotógrafo Sebastião Salgado e que está disposta a apoiar, no que for possível, a recuperação do Rio Doce.
O governo anunciou que a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, vai estudar o projeto do fotógrafo.
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