Pe. José Antonio de Oliveira
Corre pela internet uma campanha de assinaturas, com o objetivo de pedir à Rede Canção Nova o afastamento do Pe. Fabio de Melo. Motivo? Anda falando muitas heresias. E o texto cita as principais.
Em primeiro lugar, diz que “Cristo queria implantar o Reino de Deus na Terra”, e não a Igreja. “Isso é Teologia da Libertação já condenada pela Sé Apostólica”, diz o texto.
Teria dito também que a presença real de Cristo “não é apenas na Eucaristia”. O texto rebate:
“884. Cân. 2. Se alguém disser (…) seja excomungado [cfr. n° 877].” (Sic)
A outra acusação é de que o mesmo “não usa vestes clericais”. A Igreja “obriga o sacerdote a se vestir de forma diferente da dos leigos, utilizando a batina, ou camisa com colarinho romano, ou o clergyman”. Além de não usar, o padre prega “abertamente que “o hábito não faz o monge”. Mas a falta de clergyman, com certeza, faz um sacerdote desobediente”, acrescentam.
Muitos já estão assinando a petição. E aí vêm as opiniões, as condenações sumárias, muitas vezes sem um mínimo de conhecimento. Por isso, penso que vale a pena fazer algumas observações.
Com relação ao Reino e Igreja, me parece que é consenso entre quase todos os cristãos e na hierarquia católica que o objetivo primeiro de Jesus não foi fundar uma Igreja, mas instaurar o Reino de Deus. Nos evangelhos aparece a palavra Reino cerca de 114 vezes. Jesus fala do Reino mais ou menos cem vezes. Por outro lado, a palavra Igreja aparece duas vezes (Mateus 16 e 18).
Está claro que a proposta de Jesus é a construção do Reino de Deus, ou seja, a humanidade organizada a partir do Plano de Deus, marcada pela justiça, pelo amor, pela paz: “Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais vos será dado como acréscimo” (Mt 6,33). A Igreja é uma ferramenta, um instrumento para a construção do Reino. Não é fim, mas um meio. A Lumen Gentium e o Catecismo da Igreja Católica dizem que ela é semente e sinal (sacramento) do Reino. É importante e necessária, mas o Reino a transcende, vai além.
Normalmente, as pessoas que identificam a Igreja com o Reino, ou a colocam como centro e fim, têm uma dificuldade enorme para aceitar o diálogo e viver o ecumenismo. Não conseguem ver nos que creem diferente irmãos e parceiros, mas pessoas afastadas ou que estão no caminho errado.
Dizer que a Teologia da Libertação é condenada pela Igreja é um pouco temerário. Em carta aos Bispos do Brasil, em 1986, o papa João Paulo II dizia: “Estamos convencidos, nós e os Senhores, de que a teologia da libertação é não só oportuna mas útil e necessária”. O texto, na íntegra, pode ser encontrado no site do Vaticano. Quando Deus se revela a Moisés, para dar início ao processo do êxodo, afirma: “Eu vi a aflição do meu povo… Eu desci para libertá-lo” (Ex 3,7-8). Jesus, ao definir sua missão, diz: O Espírito do Senhor me ungiu (…) “enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos…” (Lc 4,18, tradução da CNBB). A teologia ou é libertadora ou não é teologia. Os desvios são outra história…
A outra acusação é por afirmar ele que a presença real de Jesus não é só na Eucaristia. Isso depende muito do que entendemos por ‘real’. Jesus disse: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou no meio deles” (Mt 18,20). Essa presença é real ou não?! “Eu estarei convosco todos os dias…” (Mt 28,20). “Quem acolhe uma destas crianças é a mim que acolhe” (Mc 9,37). “Eu estava com fome… Cada vez que fizestes isso, foi a mim” (Mt 25,31ss). Essa presença de Jesus é real?! É presença, ou não?! Em tempo: as citações do Código são falsas. Aqueles números e o teor são do Concílio de Trento, de 1545.
Finalmente, a acusação de não usar “vestes clericais”. Jesus e os apóstolos não usaram roupa diferente dos demais. O que distingue alguém não é a roupa, mas a vida. Inclusive, porque é muito fácil falsificar rótulos. E Jesus nos alerta que há muitos lobos com pele de ovelha (cf. Mt 7,15). “É pelos frutos que se conhece a árvore” (Mt 7,20). Sem querer julgar ou generalizar, é muito comum encontrar bispos, padres e pastores sem as ‘vestes clericais’ nas periferias, nos sertões, entre os pobres, nas lutas do povo, e deparar com gente de clergyman entre carreiristas e seminaristas. Tem muito ‘sacerdote desobediente’ fazendo um belo trabalho de promoção da vida por aí.
E quanto à campanha contra o Pe. Fábio (e outros), é bom lembrar que o tempo de “caça às bruxas” e da intolerância foi na Idade Média. Hoje é tempo de diálogo e tolerância. E o mandamento de Jesus é o amor.
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