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Medo do papa Francisco?
Pe. José Antonio de Oliveira
Na revista Ave Maria, do último mês de
junho, o Pe. Luís Erlin, cmf, apresenta um tema que nos desperta a
atenção. Ele registra uma pesquisa feita nos Estados Unidos sobre a
aceitação do papa Francisco naquele País. O resultado é, no mínimo,
surpreendente.
De acordo com a pesquisa, aquelas
pessoas que têm menos contato com a Igreja católica, como ateus e
pessoas de outras religiões, sobretudo não cristãs, “veem o papa como um
grande líder, alguém que merece respeito, e acreditam na benevolência
de suas intenções”.
Os católicos não praticantes percebem um
sinal de esperança e acreditam na possibilidade de mudanças mais
profundas na Igreja. Muitas pessoas, inclusive, dizem que voltaram a
frequentar a igreja e participar das celebrações. Os católicos
‘praticantes’ estão muito contentes com o Papa.
A gente sabe que uma parte do clero o vê
com certa desconfiança. Isso é muito forte na Itália, sobretudo em
Roma. Mas, de modo geral, em todos os países – e também nos Estados
Unidos, o clero “demonstra esperança” e está muito feliz com o jeito e o
testemunho de Francisco.
E aí vem a surpresa. “O setor em que o
Papa Francisco mais incomoda, segundo a pesquisa, é justamente aquele em
que menos se esperava: os seminários”. A maioria dos seminaristas dos
Estados Unidos vê com desconfiança algumas atitudes e pronunciamentos do
Papa. Isso se dá de modo especial em relação ao clericalismo, ao
carreirismo, à veemência com que o Papa exorta “a não viverem o
sacerdócio como um status social ou religioso”. “Alguns seminaristas
confessaram ter medo do futuro da Igreja”. Estão preocupados com o
futuro da função sacerdotal.
Embora a pesquisa tenha sido realizada
em um país específico, penso que o resultado não difere muito de outras
regiões do mundo. Inclusive do Brasil. Creio que entre nós a grande
maioria não vê desse modo. Mas há um número significativo de
seminaristas dentro desse perfil. E não é difícil explicar o porquê.
Quando estava na CNBB, atuando
justamente no então Setor de Vocações e Ministérios, nosso companheiro
José Lisboa, a quem muito prezo e admiro, demonstrava uma enorme
preocupação com certos tipos de ‘propaganda’ vocacional. Deparávamos com
inúmeros cartazes, folders, páginas na internet de campanhas
vocacionais. Uma grande parte desse material trazia fotos de casas
bonitas, ou até luxuosas, quartos confortáveis, áreas de esporte,
piscinas etc. Tudo para ‘atrair’ candidatos. O Lisboa sempre comentava:
se alguém entra para um seminário ou casa de formação por causa desses
atrativos, como esperar desse candidato o desejo de servir, a
gratuidade, o ardor missionário? Será que aceitará trabalhar numa
periferia, entre excluídos ou num país de missão? Terá a mística do
serviço ao próximo, do lava-pés? Quase impossível!
Outro elemento que pesa bastante são os
padres midiáticos. Pessoas que fazem sucesso na TV, no mercado da
música, nas redes sociais. A própria mídia coloca esses padres como
modelo e referência. Nunca aqueles que estão nas periferias, nas áreas
de missão, nas paróquias mais simples. Muitos jovens procuram o
presbiterato motivados por essa visibilidade, esse ‘sucesso’. Aí, entra
fatalmente o carreirismo, o estrelismo, o uso da religião para se
promover. Não é a busca de um Deus a quem quero servir, mas o servir-se
de Deus e da fé unicamente para a realização pessoal.
Há ainda a questão no
neoconservadorismo. Não são poucos os que sonham com a volta de uma
Igreja triunfalista, piramidal, clerical, marcada pela ostentação e pelo
luxo. Tempos atrás, em nossos encontros de presbíteros, tanto em âmbito
local como nacional, era marcante a presença das livrarias e editoras,
com muito material de estudo e aprofundamento. Atualmente os livros são
ofuscados por uma avalanche de paramentos coloridos, vestes caras e
finas, objetos dourados, verdadeiras boutiques do ‘sagrado’. É o domínio
da estética e do luxo.
Embora a batina e o clergyman sejam
vestes próprias para os clérigos, muitos seminaristas, antes mesmo da
Teologia, já querem usá-los. E usam! Será mesmo o desejo de se
identificar como um servidor do povo de Deus? Sinal de despojamento? Ou
vaidade e desejo de status?
Tudo isso contrasta muito com o jeito de
Jesus: pobre, simples, humilde, se misturando com pobres e pecadores.
Usando a roupa que o povo usava. Desprezando qualquer tipo de grandeza e
de poder. Fazendo da misericórdia e do serviço a sua IDENTIDADE. Esse é
também o jeito de Francisco: “o verdadeiro poder é o serviço”. Isso
agrada e faz bem a muitos. Mas também não deixa de incomodar a alguns…
9 julho, 2014
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