Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares-PE
Domingo próximo, a Igreja estará encerrando o tempo pascal. Durante
cinquenta dias, de um modo intenso e rico em símbolos, palavras e emoções, os
católicos celebramos a ressurreição do Senhor. Agora, este tempo finda com a
Solenidade de Pentecostes, que faz memorial do dom do Espírito Santo feito pelo
Cristo ressuscitado à sua Igreja.
Nós, católicos, cremos com firme certeza que Cristo ressuscitou, isto é,
atravessou o mar da Morte e entrou na glória e na plenitude de Deus, seu Pai.
Cremos que ele está totalmente transfigurado, plenificado, glorificado, da
própria vida divina, tanto no seu corpo quanto na sua alma humana. Ele, feito
totalmente humano como nós, agora se encontra totalmente divinizado na sua
humanidade. Com toda convicção, cremos que essa ressurreição e transfiguração
do nosso Jesus foram realizadas pelo Pai, que derramou sobre ele o Espírito
Santo, Deus como o Pai, Deus como o Filho. Esse Espírito Santo é principio de
vida divina, de divina energia e de dinamismo do próprio Deus. Assim, como o
fogo pode impregnar e transfigurar uma barra de ferro, deixando-a totalmente
reluzente, também o Santo Espírito impregnou a transfigurou a humanidade de
Jesus, de modo que ela agora é plena, totalmente desabrochada, plenamente
glorificada! Aquilo que, para nós, ainda é desejo e sonho - vida eterna,
felicidade sem limites, vigor pleno, vitória sobre nossas mazelas, realização
do nosso coração carente – para o Senhor Jesus é uma eterna e resplendente
realidade. Tudo isso o Pai realizou nele ao ressuscitá-lo no Espírito Santo.
Cheio desse Espírito, o Senhor Jesus o derramou sobre nós. Os apóstolos
experimentaram a ação potente e transformadora desse Espírito de Jesus já na
mesma tarde da Páscoa, quando o Ressuscitado soprou sobre eles e lhes disse:
“Recebei o Espírito Santo!” Depois, em Pentecostes, novamente experimentaram a
ação do Espírito, como força do Ressuscitado que os impelia para a missão de
anunciar Jesus. Nós também, confiados na promessa de Cristo, acreditamos e
sabemos e experimentamos que tal ação do Espírito não se restringiu aos
Apóstolos ou aos primeiros cristãos. O dom do Espírito é feito a todos os
discípulos do Cristo através de sete sacramentos que o Senhor entregou à sua
Igreja. Em cada um deles, o cristão faz uma experiência viva e real do Espírito
do Senhor, que nos une ao Cristo, vai nos transfigurando nele e nos dá acesso a
Deus, nosso Pai. Assim, a vida cristã é um misterioso dinamismo de união real
com Cristo no Espírito, até sermos totalmente impregnados da vida daquele que
por nós morreu e ressuscitou. Um sucinto exemplo: no Batismo, o Espírito nos é
dado como vida nova do Cristo ressuscitado; na Crisma, como força para
testemunhar o Senhor; na Eucaristia, o Espírito impregna o pão e o vinho a
ponto de fazer deles Corpo e Sangue do Senhor morto e ressuscitado; na
Confissão, ele é dado como Espírito de remissão dos pecados; na Ordem, ele é
Espírito de unção para gerar aqueles que, em nome de Cristo, apascentarão o
rebanho; no Matrimônio, ele unge o amor humano para que seja imagem e sinal do
próprio amor de aliança entre Cristo e a Igreja; na Unção dos Enfermos, ele é
Espírito de consolo e força para unir nossas dores às de Cristo. Note-se a
centralidade da experiência do Espírito Santo para a vida dos cristãos! Estes
são homens e mulheres que devem ser impregnados e conduzidos pelo Espírito. Não
somos simples admiradores de Jesus ou seus “seguidores”. Somos aqueles
impregnados realmente pela Vida que faz Jesus viver, isto é, pelo Espírito de
Jesus. Ou isso, ou não somos cristãos de modo algum! A relação entre o Senhor
Jesus e os cristãos não é simplesmente de um sentimento, mas há algo de
concreto, misterioso, sacramental: nós nele e ele em nós, nós membros de seu
corpo e ele nossa Cabeça, nós somos os ramos, ele é a Videira verdadeira!
Nós cremos, conforme as promessas do Senhor, que o seu Espírito impregna
toda a vida da Igreja, de um modo profundo, visceral, tantas e tantas vezes
imperceptível... É pelo Espírito do Ressuscitado que a Igreja é Santa, porque
santificada por ele; por ele ela permanecerá viva até o fim dos tempos, por ele
não trairá nunca a fé apostólica recebida uma vez para sempre, por ele também
essa doutrina não fica presa de modo esclerosado a um passado, mas vai sempre
progredindo e aprofundando a compreensão do mistério de Cristo nas várias
mudanças dos tempos. Também por obra e presença desse Espírito, os cristãos
experimentam Jesus como alguém vivo, os cristãos “vêem” Jesus na sua Palavra,
nos sacramentos, na vida da Comunidade dos discípulos, nos acontecimentos e
circunstâncias da vida e do mundo. Essa experiência faz com que os cristãos
interpretem as realidades do mundo de modo diferente dos não-cristãos. Jesus
afirmou claramente que nós haveríamos de vê-lo novamente e o mundo não mais o
veria. Isso não é brincadeira! Nós fazemos sim essa experiência incrível:
fazemos a experiência real e profunda do Senhor Jesus vivo e a nós presente na
potência do seu Espírito Santo. Eis a inspiração para o nosso modo de pensar e
agir... Claro que o mundo não poderá nos compreender, porque não tem essa
experiência fundamental que condiciona o nosso modo de ser e viver...
Daqui derivam as diferenças de opções – às vezes clamorosas – entre a
Igreja e o mundo. E quanto mais o mundo fechar-se numa razão autossuficiente e
imanentista, tanto mais essas diferenças vão aparecer de modo exasperado, até,
às vezes, à contraposição e ao conflito. Jamais poderemos impor a ninguém nossa
experiência e devemos sempre respeitar as convicções dos outros, que não crêem
como nós, mas, doutra parte, jamais poderemos negar ou esconder aquilo que para
sempre transfigurou nosso coração e mudou nossa vida. É que a ação desse
Espírito, além de nos fazer testemunhar Jesus sem medo, enche-nos de um vigor e
um consolo tais, que espantam toda dúvida e infundem em nós a mais doce e
profunda e suave certeza. Na força do Espírito é que os mártires de ontem e de
hoje deram a vida para testemunhar seu Senhor! Eis, alguns dos frutos do
Espírito do Ressuscitado... Eis o Espírito Santo, Vida da nossa vida, esse
ilustre Desconhecido...
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